O uso excessivo de telas digitais por crianças e adolescentes tem se tornado uma preocupação crescente entre pais, educadores e especialistas. Estudos indicam que essa exposição pode causar problemas motores, cognitivos, e na visão, além de afetar as interações sociais e as habilidades socioemocionais dos jovens. O Relatório TIC Kids Online Brasil 2023 revela que 95% das crianças e adolescentes entre 9 e 17 anos usam a internet, o que representa cerca de 25 milhões de pessoas, e o acesso ocorre cada vez mais cedo — 24% começam antes dos 6 anos de idade.
A Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), por meio do Laboratório Interdisciplinar de Pesquisa em Neurodesenvolvimento Humano (Linha), está investigando os impactos do uso de mídias digitais em crianças e adolescentes. A pesquisa, realizada em parceria com a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), aponta que, durante a pandemia, o tempo de tela aumentou consideravelmente devido à falta de interações sociais, o que impactou negativamente a saúde mental e o comportamento das crianças e suas famílias.
Segundo a professora Nara Andrade, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFJF, há uma correlação entre o aumento do uso de telas e níveis mais elevados de estresse parental, particularmente em mães, além de sintomas de ansiedade e depressão nas mesmas. “A exposição precoce e excessiva a telas pode prejudicar o desenvolvimento da linguagem, atenção e regulação emocional das crianças, especialmente nos primeiros anos, quando o cérebro está em plena plasticidade”, explica.
A psicóloga Juliana Soares, mãe de duas crianças pequenas, afirma que busca evitar ao máximo o uso de telas pelas filhas, optando por atividades que estimulem o desenvolvimento motor e cognitivo, como desenhar, brincar com massa de modelar e participar de contação de histórias. Ela também comenta as dificuldades que muitas mães enfrentam para controlar o uso de telas, muitas vezes recorrendo a elas como uma "válvula de escape" devido à exaustiva rotina. “Apesar de ser desafiador, é essencial que os responsáveis busquem alternativas saudáveis para o desenvolvimento dos filhos”, reflete Juliana.
De acordo com Nara, três fatores são essenciais ao avaliar o impacto do uso de telas: contexto, conteúdo e tempo. No contexto certo, como chamadas de vídeo com familiares distantes, as tecnologias podem ter um papel positivo, reforçando laços sociais. No entanto, o uso de conteúdo inadequado ou excessivo pode prejudicar o neurodesenvolvimento.
Crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) são particularmente vulneráveis aos impactos do uso excessivo de telas. Pesquisas mostram que o uso prolongado pode agravar comportamentos repetitivos, impulsivos e dificultar a autorregulação emocional.
A professora Anna Costa Ribeiro, da UniAcademia/JF, ressalta que, durante a primeira infância (zero a três anos), as telas não são necessárias para o desenvolvimento, sendo a interação com cuidadores e o ambiente ao redor mais importantes. Ela recomenda atividades que envolvam motricidade livre, brincadeiras, troca verbal e contato físico para garantir um desenvolvimento saudável e adequado às necessidades da criança.
Para Juliana Soares, a solução está em encontrar um equilíbrio. “Busquem atividades que estimulem a criatividade, interação social e habilidades motoras. Essas experiências aproximam os pais e fortalecem vínculos afetivos, criando memórias duradouras”, conclui.
Em parceria com o consórcio internacional Comprehensive Assessment of Family Media Exposure (Cafe), a doutoranda Fernanda Monteiro, do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFJF, está conduzindo uma pesquisa que analisa a relação entre a dinâmica familiar e o uso de mídias digitais por crianças pequenas. A pesquisa visa compreender os custos e benefícios das tecnologias digitais durante a primeira infância, observando não apenas o tempo de tela, mas também o contexto em que são utilizadas.
A coleta de dados está em andamento, e interessados em participar da pesquisa podem acessar o questionário online no site da UFJF.
Em um mundo cada vez mais digital, é fundamental que os pais estejam atentos ao uso de telas pelas crianças, buscando um equilíbrio entre o desenvolvimento saudável e as inevitáveis tecnologias.
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