Por Alexandre Müller Hill Maestrini, professor e escritor
Entre 1808 e 1858, no período em que precedeu à chegada dos imigrantes germânicos em Juiz de Fora, o Brasil e as Minas Gerais passavam por profundas transformações conjunturais: a chegada da Corte Portuguesa com 15.000 pessoas em 1808 pressionada pela ascensão de Napoleão Bonaparte na Europa e a abertura dos portos às nações amigas. Sete anos mais tarde, em 1815, o Brasil é elevação a Reino Unido a Portugal e Algarves. Com a queda de Napoleão o Rei Dom João e parte da Corte voltam para Portugal em 1821 e um ano mais tarde seu filho Dom Pedro I declara a Independência do Brasil, mas abdica em 1831. Entre 1831 a 1840 o Brasil era governado pelos regentes do príncipe ainda menor de idade, período que ocorrem muitas rebeliões. Culminando com a emancipação de Dom Pedro II. Em 1850 com a promulgação da lei Eusébio de Queirós é extinto o comércio der escravos para o Brasil e inicia-se grandes transformações da sociedade brasileira.
Nesse mesmo ano Juiz de Fora ainda era chamada de cidade do Parahybuna e estava inserida no caminho entre as Minas Gerais e a Corte Imperial no Rio de Janeiro. A região crescia principalmente pela economia cafeeira baseada na mão de obra de imigrantes negros escravizados. A Zona da Mata detinha quase 100% da produção cafeeira da Província de Minas Gerais e utilizava um vasto território, composto de várias fazendas, nas quais trabalhavam uma média de 100 imigrantes negros escravizados por fazenda. Eles eram a base da construção da nação brasileira com seu sangue, suor e lágrimas. Em 1855 viviam na cidade um total de 4.000 pessoas negras escravizadas e 2.400 pessoas livres. Mas com a proibição do tráfico negreiro e a perspectiva da possível falta de mão de obra nas lavouras, os Barões do Café da Zona da Mata Mineira, dependentes dessa mão de obra escrava, sofriam sérias consequências econômicas e políticas.
Nesse contexto histórico o cafeicultor Mariano Procópio Ferreira Lage recebeu do Governo Imperial um financiamento para recrutar 2.000 imigrantes germânicos. Em 1858 chegaram na cidade mais de 1000 germânicos vindos de diversas regiões de uma Europa em crise e dispostos a pagar pelas terras prometidas na Colônia Dom Pedro II. Pouco tempo após alguns deles abandonaram a agricultura e foram exercer outras funções, empreender em cervejarias, curtumes, fábricas diversas e oferecer seus serviços especializados. As regiões de origens desses imigrantes eram diferentes, mas todos tinham no idioma alemão uma identidade comum. Em 1861, apenas três anos após a chegada dos alemães, Mariano Procópio Ferreira Lage inaugurava a Rodovia União e Indústria e muitos dos contratos com os alemães da Companhia são encerrados. Nesse mesmo ano o imigrante badense Sebastian Kunz fundou a primeira cervejaria de Minas Gerais, a Cervejaria São Pedro.
Atualmente a produção local de cerveja é feita por mais de 130 pequenos produtores associados à ACERVA da Zona e representa uma das principais motores do setor turístico de negócios de Juiz de Fora. Baseado na tradição cervejeira alemã a formação do Polo Cervejeiro de Juiz de Fora não foi fruto do acaso, mas coincide com os dois ciclos da imigração alemã, registrado no Livro Cerveja, Alemães e Juiz de Fora. A primeira onda imigratória em 1858 e com vinda da fábrica alemã Mercedes-Benz para Juiz de Fora em 1999 veio a segunda de imigração alemã, marcando o renascimento da produção de cerveja na cidade.
Atualmente a bebida preferida dos primeiros imigrantes germânicos continua a mais popular na cidade. O pão líquido, como é conhecida pelos cervejeiros, sempre representou um importante elo entre a Alemanha e Juiz de Fora, além de transportar uma grande bagagem cultural, revela a diversidade, a versatilidade e uma profunda importância histórica da imigração. Poucos dos cervejeiros atuais de Juiz de Fora são descendentes dos germânicos que vieram para a cidade em diversas épocas trazendo o prazer e a tradição da cervejaria: Peters, Kelmer, Wenzel, Pável, Gross, Guelber, Lembke, Werneck, Monnerat, Haider, John, Hill, Bauer e outros. Mas apesar da miscigenação ocorrida, algumas influências germânicas ainda permanecem nas mentes de descendentes e cervejeiros da cidade e região.