Por Alexandre Müller Hill Maestrini, professor de alemão e escritor
Nosso Município de Juiz de Fora recebeu muitas influências alemãs com a chegada de mais de 1000 imigrantes em 12 de junho 1858. Hoje seus descendentes depois de cinco gerações já somam mais de 60.000 pessoas. É para esses descendentes que dedico esse divertido texto sobre algumas particularidades do idioma de nossos antepassados. A língua transporta não só conteúdo, mas também cultura, tradição, modo de viver e pensar.
No alemão as vezes existem palavras para explicar aquilo que nós brasileiros precisamos de várias palavras. Eles simplesmente unem as palavras “Volk” + “Wagen” e vira Volkswagen para descrever o “carro do povo”, mas no Português precisamos de um “do”, “da” ou “de” para unir duas palavras. Outro exemplo: em “Deutschkurs”, “Deutsch” significa alemão e “Kurs” significa curso e, logicamente encadeadas, significa Curso de Alemão. Tudo uma questão de lógica. Outra curiosidades são as palavras que parecem enormes, mas com o tempo acostuma-se com elas e com as vááárias consoantes juntas. Parece simples mas não é, a dica dos professores do Instituto Autobahn é tentar começar a ler essas palavras enormes começando de traz pra frente.
Na hora de construir frases em alemão com verbos auxiliares e construções temporais, o verbo principal virá sóóó lá antes do ponto final. Imaginem essa frase simples com dois verbos: Eu quero comprar uma bicicleta. Mas em alemão o primeiro verbo vem sempre na segunda posição colado ao sujeito; já o segundo verbo vai obrigatoriamente para o final. Então como fica a frase? “Eu quero uma bicicleta comprar”. E você pode “encher linguiça” a vontade, mesmo assim o verbo ainda continua no final: “Eu quero amanhã pela manhã uma bicicleta rosa com pneu de asfalto na loja do seu Manuel comprar”. E piora, acredite! Quando se tem uma frase ligada a outra como por exemplo com “porque, se, quando ou que”, vai tudo lá pro final: “Ele disse que amanhã pela manhã uma bicicleta rosa com pneu de asfalto na loja do seu Manuel comprar quer”. E por aí vai…
Seguindo essa lógica, em Alemão existem verbos que se dividem em prefixo+raiz. Imaginem os verbos brasileiros fazer e desfazer; um alemão falaria mais ou menos assim: “Eu faço um nó”, mas “Eu faço um nó des” – nesse caso com significado de desfazer o nó. Mas se tiver um verbo auxiliar esse prefixo voltará para o final e se ligará novamente à raiz do verbo e os alemães falariam: “Eu estou feliz, quando eu um nó desfaço”. Mais diversão? Saibam que um prefixo adicionado a um verbo transforma esse verbo em outra coisa totalmente diferente. Para os que gostam de beber uma cervejinha, atenção, o verbo beber significa “trinken” em Alemão, mas “abtrinken” tem o significado de beber, porém beber só um pouquinho de um copo quase transbordando quando se serviu muita bebida. Já o verbo “austrinken” significa beber, porém beber até o fim do copo; “durcheinandertrinken” significa beber vários tipos de bebidas misturando tudo; já “tottrinken” significa beber até morrer e “vertrinken” é gastar todo o dinheiro com bebidas. Por isso nunca se esqueça que o alemão é muito preciso e ao ler um texto em alemão os prefixos vão para o final e é só nessa hora que você vai saber se o cara alemão queria beber até morrer ou beber só um pouquinho.
Mais confusão? Já ouviu falar que os alemães lêem os números ao contrário: pois é 29 em Alemão lê-se “nove+vinte”; entre 21 e 99 se fala de trás pra frente. Se você perguntar a um alemão quantos anos ele tem? Ele vai te responder: nove+vinte (29). Em que ano ele nasceu? três+oitenta (83). O idioma esconde ainda outras surpresas e que o povo alemão é muito liberal já sabemos, mas o idioma ter três gêneros é loucura. Além de masculino e do feminino, existe um terceiro gênero: o neutro. A lua é masculina (der Mond), o sol é feminino (die Sonne) e a menina é neutra (das Mädchen); criança e bebê também são neutros. Pode?
Para os alemães a ordem importa, e muito! E isso faz com que eles tenham criado o hábito de escutar muito bem os parceiros e não interromper aquele que ainda está concluindo sua frase e seu pensamento. Como consequência dessas construções, numa conversa em Alemão, muitos escutam e um só fala. Já na nossa cultura no Brasil, mesmo com as frases que trazem mais de um verbo, eles sempre estão logo no início. Por isso as pessoas se acostumaram logo que escutam os verbos a interromper quem está falando por acharem que já entenderam o que a outra pessoa queria falar. Assim as conversas entre brasileiros acabam virando uma sequência de interrupções – uma festa; os detalhes vão se perdendo e acabamos muitos falando ao mesmo tempo e poucos escutando. Neste momento podemos ver os alemães perdidinhos, coçando a cabeça e sem entender nada do que está acontecendo. Nem melhor nem pior, somente diferente.